Lobão e Sarney lutam contra a ampulheta (relógio de areia) pela indicação para o Ministério de Minas e Energia. Quanto mais o tempo passa, mais péssimas notícias aparecem podendo desestabilizar a indicação do PMDB. É investigação da Polícia Federal em Fernando Sarney. É denúncia do Ministério Público em Edinho Lobão. São coisas e mais coisas da vida de Lobão surgindo a cada dia. A dupla torce para indicação sair logo. Enquanto isso, Lula cozinha...
Abaixo, o Jornal Pequeno de hoje (http://www.jornalpequeno.com.br/2008/1/13/Pagina71263.htm) traz reprodução de matéria da Revista Época com mais fatos trazidos à tona neste fim de semana. A semana promete...
Imprensa nacional destaca suspeitas que podem complicar nomeação de Lobão para Minas e Energia
Menos de um ano depois da operação Navalha da Polícia Federal – escândalo que provocou a demissão de Silas Rondeau do Ministério de Minas e Energia –, os interesses da família do ex-presidente José Sarney no setor elétrico estatal estão gerando um curto-circuito político em Brasília. Na divisão do poder entre os aliados do presidente Lula, o ministério está na cota da bancada do PMDB do Senado, ou seja, de José Sarney. Mas ele é chefiado há nove meses pelo interino Nelson Hubner, ligado ao PT. O PMDB esperava receber o posto de volta na semana passada, mas três fios desencapados ameaçam eletrocutar a operação.
O primeiro fio solto é o nome indicado por Sarney para o cargo: o senador Edison Lobão (PMDB-MA). Sem nenhuma experiência no ramo, torná-lo ministro seria um mau sinal no momento em que a incerteza volta a rondar o abastecimento de energia. O segundo fio perigoso é o suplente do senador, seu filho Edison Lobão Filho, conhecido como Edinho. Se o pai virar ministro, Edinho irá para o Senado levando um rosário de investigações e suspeitas, quando a Casa ainda não se recuperou do processo contra Renan Calheiros (PMDB-AL). O terceiro cabo, de mais alta voltagem, são as investigações da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público Federal sobre os negócios do empresário Fernando Sarney, filho do ex-presidente e eminência parda do setor elétrico.
Fernando sob investigação – Desde novembro de 2006, Fernando, o administrador dos negócios da família Sarney no Maranhão, está sob investigação da PF e do Ministério Público Federal. O ponto de partida foi um comunicado do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Fazenda ao Ministério Público sobre movimentações atípicas, de mais de R$ 3 milhões, em contas bancárias controladas por Fernando Sarney. No fim do ano passado, a família Sarney descobriu que os telefones de Fernando estavam grampeados pela PF. Amigos de Sarney contam que o ex-presidente ficou transtornado com a informação. José Sarney acionou o advogado brasiliense Antonio Carlos “Kakay” Almeida Castro, dono de forte círculo de amizades no governo, para saber a extensão dos danos. Depois de uma batalha nos tribunais para ter acesso aos dados da investigação, Kakay e o advogado Eduardo Ferrão descobriram que os sigilos bancário e fiscal de Fernando, de sua mulher, Teresa Murad Sarney, e de contadores de suas empresas também haviam sido quebrados.
Na Justiça, o Ministério Público Federal no Maranhão obteve a quebra do sigilo telefônico do filho de Sarney em dezembro, mas ele já havia sido apanhado, há quase um ano, em grampos armados pela PF para outras investigações. Esse conjunto de informações desatou entre os amigos de Sarney uma teoria da conspiração. As investigações teriam o objetivo de intimidar e enfraquecer o PMDB e Sarney, o mais importante aliado do governo no Congresso. Um dos objetivos da conspiração seria manter o Ministério de Minas e Energia sob o controle da poderosa ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, a quem o interino de Minas e Energia, Nelson Hubner, é ligado.
Teorias à parte, o fato é que os investigadores da PF e do MP dizem ter encontrado matéria sólida nas contas de Fernando Sarney e suas empresas. No Maranhão, o Ministério Público suspeita do trânsito de dinheiro entre o Sistema Mirante de Comunicação (uma rede de emissoras de rádio, televisão e jornal, vitrine dos negócios da família Sarney) e a São Luís Factoring e Fomento Mercantil Ltda., outra empresa familiar até então desconhecida. Empresas de factoring trocam cheques e outros títulos a prazo por dinheiro à vista – e cobram comissão por isso. É o que faz a São Luís Factoring e Fomento Mercantil Ltda. O problema é que, com a quebra dos sigilos bancário e fiscal autorizada pela Justiça, descobriu-se que a São Luís só realiza transações entre as próprias empresas do grupo Sarney. Anualmente, a São Luís costuma movimentar mais de R$ 100 milhões. Só no ano passado, a empresa lucrou cerca de R$ 25 milhões em juros e comissões – supostamente cobrados de suas co-irmãs do Grupo Mirante. “Esse é o calcanhar-de-aquiles dessas operações que estamos investigando”, disse uma autoridade diretamente envolvida na apuração, sob a condição de anonimato porque a investigação corre em segredo de Justiça.
A São Luís Factoring foi aberta em julho de 2000. Hoje, está registrada em nome de um contador do grupo e de Teresa Murad Sarney. Teresa é também a atual presidente da Gráfica Escolar, que edita o jornal O Estado do Maranhão, um dos veículos do pool de comunicação da família Sarney, que inclui três emissoras de rádio e a TV Mirante. O endereço da factoring é o mesmo do jornal e da TV Mirante. Os investigadores dizem se concentrar agora na suspeita de que a empresa tenha servido para lavar dinheiro. “O lucro declarado dessa factoring pode ser uma forma de esquentar dinheiro”, afirma um dos investigadores.Sigilo da Mirante quebrado – A Receita Federal já instaurou uma ação fiscal contra o grupo. O juiz federal Neian Milhomem Cruz, da vara especializada em lavagem de dinheiro de São Luís, autorizou a quebra de sigilo bancário da TV Mirante, da Gráfica Escolar e da São Luís Factoring.
Na Polícia Federal, em vez de ser tocada pela Superintendência do Maranhão, a investigação foi concentrada em Brasília. Está a cargo da Divisão de Crimes Financeiros, a mesma que investigou o mensalão. Em março do ano passado, um delegado da divisão foi a São Luís e pediu a ampliação da quebra do sigilo bancário. Hoje, nos 13 volumes que compõem o inquérito, estão todas as movimentações financeiras do grupo realizadas entre 2002 e 2006. Antes do pedido, havia sido quebrado o sigilo apenas das operações realizadas nos três meses anteriores à eleição.
Grandes saques – O relatório do Coaf alertou a Polícia Federal e o Ministério Público sobre os grandes saques em dinheiro vivo das contas de Fernando Sarney às vésperas do segundo turno da eleição de 2006. O primeiro movimento se dá em 23 de outubro. É quando o empresário Eduardo de Carvalho Lago, concunhado de Fernando Sarney, deposita R$ 2 milhões na conta da Gráfica Escolar. No dia seguinte, o dinheiro volta para a conta de Lago. Em seguida, a transferência é refeita. Desta vez, Eduardo Lago deposita diretamente na conta de Fernando Sarney. O primeiro saque, de R$ 1,2 milhão, foi feito em 25 de outubro. Os R$ 800 mil restantes foram retirados no dia 26. Nas duas vezes, o dinheiro foi sacado em espécie. Os saques foram feitos na agência 2192 do Bradesco, no centro de São Luís, onde Fernando Sarney mantém conta. Houve ainda outras movimentações atípicas. Segundo o relatório do Coaf, entre 27 de setembro e 27 de outubro, foram retirados mais R$ 1.022.450 de contas da TV Mirante. Os saques, também em dinheiro vivo, foram feitos por Carlos Henrique Campos Ferro e Teresa Cristina Ferreira Lopes. Segundo Fernando Sarney, os dois são funcionários da emissora. Teresa Murad e advogados da família Sarney preferiram não se pronunciar sobre o caso da São Luís Factoring.
Financiamento ilegal de campanha – A proximidade das movimentações com o segundo turno da eleição de 2006, realizado em 29 de outubro, levou os investigadores a suspeitar de que os saques possam ter relação com o financiamento da campanha de Roseana Sarney ao governo do Maranhão, em 2006. Fernando Sarney era o tesoureiro informal da campanha da irmã. Roseana, à época no PFL, está hoje no PMDB. E acabou perdendo a disputa para Jackson Lago, do PDT. O maior desafio da investigação, agora, é refazer o caminho do dinheiro. Eduardo Lago e Fernando Sarney dizem tratar-se de um empréstimo para fins privados. Se a natureza da operação era essa, os investigadores se perguntam por que, então, o dinheiro foi sacado em espécie. Se a hipótese da investigação sobre dinheiro para financiamento eleitoral for verdadeira, essa não seria a primeira vez que os Sarney se expõem por causa de dinheiro de campanha.
Em 2002, a candidatura de Roseana à Presidência da República implodiu depois que a PF encontrou R$ 1,3 milhão no escritório da empresa Lunus, dinheiro que segundo a polícia seria para o caixa dois da campanha. Para o clã Sarney, aquela ação policial teria sido encomendada para tirar Roseana do caminho do tucano José Serra, que era o candidato oficial ao Palácio do Planalto. Nessa época, Roseana tinha deslanchado nas pesquisas entre os favoritos.
Poder minado – Da mesma forma, a família e os aliados suspeitam que o cerco às empresas administradas por Fernando teria o objetivo de minar o poder do clã em Brasília, o que inclui a sucessão nas Minas e Energia. De acordo com aliados próximos, a descoberta da extensão das investigações foi um dos motivos que levaram Sarney a recusar a indicação do PMDB para disputar novamente a presidência do Senado, na vaga aberta pela renúncia de Renan Calheiros, em dezembro. O experiente senador, segundo essa versão, avaliou que sua candidatura poderia atrair atenções para acusações contra o filho e as empresas da família.
Bom atacante – Fernando Sarney ocupa um lugar estratégico no organograma da família Sarney. Embora seja uma pessoa extrovertida, não se expõe aos holofotes longe de casa – diferentemente do pai, da irmã senadora e do irmão deputado e ex-ministro Zequinha Sarney. A atividade que mais o aproxima da política, oficialmente, é o cargo de vice-presidente da Confederação Brasileira de Futebol. Quando viaja para Brasília, Fernando despacha no escritório da CBF na capital. Recentemente, ajudou o presidente da confederação, Ricardo Teixeira, a enterrar no Congresso a CPI do Corinthians. Além de cartola, Fernando é desportista. Joga futebol em qualquer modalidade – campo, areia, quadra – e é considerado um bom atacante. No Maranhão, Fernando Sarney é um verdadeiro agitador cultural. Em São Luís, comanda festas de micareta, ali chamada de Marafolia, escreve letras para o grupo local Bicho Terra, dá canjas de gaita em boates e convive com músicos e artistas plásticos. Na juventude, Fernando chegou a tocar em uma banda de rock. Por um breve período, brevíssimo, pensou em seguir a carreira musical. Foi desencorajado pela mãe, dona Marly, e pelo pai. Estudioso, fluente em cinco idiomas, formou-se em Engenharia Elétrica na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, a Poli da USP. Depois de trabalhar numa empresa em São Paulo, Fernando voltou para São Luís e assumiu a presidência da Companhia Elétrica do Maranhão (Cemar).
A estatal foi comprada e depois devolvida ao governo pela americana PPL, num dos mais estranhos casos do processo de privatização do setor elétrico. Na Cemar, Fernando conheceu Silas Rondeau, que se tornaria depois ministro de Minas e Energia. De lá para cá, amigos do tempo da Poli acompanham sua trajetória. Um dos expoentes do grupo é o engenheiro Astrogildo Quental, diretor-financeiro da Eletronorte e candidato dos Sarneys à presidência da Eletrobrás, hoje controlada pelo PT.
Conspiração – Para a cúpula do PMDB, as acusações contra o grupo de Sarney são uma conspiração que parte de setores do PT interessados em enfraquecer o PMDB. No Congresso, os dois partidos são aliados, mas na Esplanada dos Ministérios disputam palmo a palmo cada nicho de poder. Essa relação conturbada explicaria os tiros disparados contra o grupo de Sarney pela Polícia Federal, subordinada ao ministro petista da Justiça, Tarso Genro, e dirigida pelo ex-petista Luis Fernando Correa. Na cúpula do PMDB, o ministro Tarso Genro é chamado de “Edgar”, numa alusão a J. Edgar Hoover, o lendário chefe do FBI que se manteve no cargo durante décadas (de 1924 a 1972) manipulando segredos dos políticos dos Estados Unidos.
O caso Lobão – Na noite da quinta-feira, o presidente do PMDB, Michel Temer, foi ao Palácio do Planalto acompanhado de Sarney, do presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), e de outros chefes do partido. Indicaram oficialmente o nome de Edison Lobão para o Ministério de Minas e Energia. Lobão, de 71 anos, fez sua carreira política à sombra de Sarney, de quem se tornou amigo na década de 1960. Até o ano passado, era um dos peões do esquema Sarney no DEM, mas entrou no PMDB em busca da presidência do Senado ou do Ministério de Minas e Energia.
Com a eleição de Garibaldi Alves no Senado, restou a segunda opção. Lobão foi governador do Maranhão de 1991 a 1994. As maiores marcas de seu governo foram a influência da então primeira-dama, hoje deputada, Nice Lobão, conhecida como mandona, e a ascensão dos negócios de seu filho Edinho. O grupo que foi ao Planalto esperava voltar para casa com a fatura liquidada, mas todos saíram frustrados. Lula elogiou protocolarmente a indicação, mas deixou para fazer o convite a Lobão (ou seja, decidir se ele será mesmo ministro) numa conversa que só deve ocorrer depois da quarta-feira 16, quando voltar de uma viagem com paradas na Guatemala, em Cuba e no Acre. Sintomaticamente, Lula comentou com os aliados o noticiário da imprensa sobre os processos que envolvem Lobão e seu filho suplente. “Ele está apanhando muito?”, perguntou Lula, segundo um dos presentes. “A mídia sempre faz isso quando o político tem o nome lançado para um ministério”, disse o presidente. Os aliados deixaram o Planalto com a impressão de que Lula joga com o tempo porque tem receio de enfiar os dedos nessa perigosa tomada.
Exposto a mais uma semana de noticiário negativo, Lobão pode acabar torrado de vez ou, na melhor hipótese, ser obrigado a compartilhar o comando de Minas e Energia com dirigentes indicados pela Casa Civil. Nas palavras de um chefe partidário, “um ministério com os bigodes de José Sarney e a cabeça da Dilma Rousseff”. (Andrei Meireles, Ricardo Amaral e Rodrigo Rangel, da Época).
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Publicado em agosto 9, 2024 por Walkir Marinho
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